quarta-feira, 14 de novembro de 2012

A mente de quem faz negócios


A ciência começa a mostrar como funciona o cérebro e até o DNA de uma criatura essencial ao desenvolvimento: o empreendedor


Por GRAZIELE OLIVEIRA para Revista Época

O filósofo milanês Carlo Cattaneo tentava, no século XIX, entender por que algumas regiões cheias de comerciantes prosperavam mesmo sem haver nenhum aumento aparente no número de trabalhadores, na terra disponível ou no dinheiro para investimentos, elementos que ele chamava de “física da riqueza”. Aquele algo a mais, intangível e fundamental, Cattaneo chamou de “inteligência da riqueza”. No século XX, o economista britânico John Maynard Keynes, um dos mais influentes da história, concluiu que esse algo a mais não é exatamente uma inteligência, e sim um impulso difuso.
Keynes denominou essa vontade – criar negócios mesmo correndo riscos – de “espírito animal”. Uma sociedade não consegue criar ou controlar esse impulso, apenas incentivá-lo, a fim de enriquecer ou escapar de uma crise. Faz 150 anos que Cattaneo pensou na inteligência da riqueza, e só agora começamos a ter pistas sobre o que ocorre na cabeça do empreendedor. Por que alguns de nós, diante das duas opções, preferem não ter um emprego? E, em vez disso, criar um negócio próprio, assumir mais riscos e apostar numa ideia?
As pesquisas mais recentes mostram que esses seres especiais representam, em média, uma pequena fatia de qualquer população, de 3,5% a 5%. Estão nesse grupo apenas os que empreendem por oportunidade, e não os pressionados pela falta de opção. Algumas sociedades parecem especialmente bem-dotadas nesse quesito. O Brasil está entre elas. Segundo o levantamento Global Entrepreneurship Monitor 2011 (conduzido no país pelo Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade), são empreendedores por oportunidade 10% dos brasileiros. O Brasil está na 12a posição entre 54 países.
Hoje, os estudiosos do fenômeno se dividem em duas frentes principais: a psicologia e a neurologia. A maioria admite haver causas variadas, biológicas e culturais, para que se forme um desses cérebros inquietos. O psicólogo e consultor Luiz Fernando Garcia já trabalhou com mais de 1.200 microempresas em 20 anos. Ele identifica, na formação da personalidade empreendedora, efeitos muito fortes do meio e também o que parece ser um componente genético. “Temos genes associados a certas habilidades mentais que parecem interferir especialmente na personalidade do empreendedor”, afirma Garcia, autor do livro recém-lançado Empresários no divã e instrutor no programa Empretec, do Sebrae, de desenvolvimento do comportamento empreendedor. Estudos diversos vêm amparando essa compreensão.
No início de setembro, pesquisadores de administração e economia das universidades Harvard, nos Estados Unidos, e de Estocolmo, na Suécia, comprovaram a relevância de um gene de regulação de hormônios (o AVPR1) na formação do cérebro empreendedor. Ele influi em como enfrentamos riscos. A neurocientista Angela Stanton, pesquisadora associada ao Instituto Max Planck, na Alemanha, acredita numa forte relação entre os níveis de hormônios, como esteroides e cortisona, e o impulso de abrir um negócio próprio. Ela tenta entender por que alguns de nós lidam mais facilmente com situações ambíguas, desafios e ameaças. Angela tende a crer que empreendedorismo é uma característica inata, impossível de ensinar. Hal Gregersen, professor na escola de negócios francesa Insead e coautor do livro DNA do inovador, diz que a combinação perfeita mistura predisposição genética com um ambiente de questionamento, observação, relacionamento e experimentação. “Acredito que Steve Jobs tinha essa herança genética e, desde muito jovem, contou com pessoas próximas que o empurraram para um caminho criativo”, afirma. Essas várias frentes de pesquisa também chegam a algumas definições comuns sobre as características do empreendedor. Eles tendem a ser visionários, questionadores, experimentadores, arrojados e criativos – e cada uma delas, em dose exagerada, pode resultar em problemas (leia no quadro abaixo).
Como funciona o criador de negócios (Foto: Reprodução/Revista ÉPOCA)
O empresário Edmundo Rodrigues, fundador da rede de lojas de decoração Espaço Til, considera-se criativo e determinado, mas sabe que, em exagero, essas qualidades se transformam em descolamento da realidade e teimosia – alguns citariam Jobs como exemplo aqui também. “Tive de aprender a usar essas habilidades de forma produtiva, sem excessos”, afirma. “A qualidade certa na dose errada faz do sujeito um cabeça-dura.” Rodrigues encontrou sua própria forma de conter os excessos: dedica-se a aprender a ouvir conselhos.

Fonte:
http://revistaepoca.globo.com/Negocios-e-carreira/noticia/2012/11/mente-de-quem-faz-negocios.html

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